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Na Índia, o WhatsApp é uma arma de ódio antissocial

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Fonte: Carta Capital - Politike/ Por Rohit Chopra

 

 

Uma eleição geral na Índia, a democracia mais populosa do mundo, parece uma impossibilidade teórica. Coletar os votos de quase um bilhão de indianos envolve, há mais de meio século, desafios de logística, política, economia, violência e lei.

Neste ano, um novo desafio surgiu na forma de mídia social – especificamente via WhatsApp. Discursos de ódio, desinformação e rumores assustadores na plataforma são responsáveis por violência e mortes na Índia.

india carta capitalTenho estudado o impacto da internet na vida política, cultural e social indiana por quase duas décadas. As eleições parlamentares de 2019, agora em andamento, mostrarão como as mídias sociais afetam a democracia indiana. Elas também fornecerão informações adicionais sobre a natureza das ameaças tecnológicas à democracia em geral.

 

Mídia social indiana em 2014

Dois anos antes de fazendas de trolls russas se infiltrarem no Facebook para tentar influenciar a eleição presidencial dos EUA em 2016, as mídias sociais desempenharam um papel fundamental na política indiana. Elas auxiliaram o partido nacionalista hindu Bharatiya Janata e seu candidato linha-dura a primeiro-ministro, Narendra Modi, a chegar ao poder.

O partido Bharatiya Janata realizou uma formidável campanha de mídia social no Facebook e, em menor grau, no Twitter. Os esforços online da legenda complementaram e suplementaram sua campanha igualmente bem orquestrada nas ruas.

O partido treinou equipes de mídia social e um verdadeiro exército de voluntários entusiastas garantiram que a presença online do grupo fosse muito mais ativa do que a de seus rivais. Juntos, eles desencadearam uma onda muitas vezes abusiva de críticas a seus oponentes.

No período que antecede a eleição de 2019, as mídias sociais tem sido usadas de maneira muito mais perigosa. O Bharatiya Janata tem até o seu próprio aplicativo oficial, repleto de desinformação e propaganda contra não-hindus, postada por integrantes do partido e apoiadores. Mais amplamente, o WhatsApp é usado para disseminar rumores e desinformação para despertar o medo entre a população.

Isso se conecta com a principal mensagem do Bharatiya Janata de que os hindus deveriam ter predominância na Índia e que o país deveria ser culturalmente hindu, em vez de um Estado secular governado por uma diversidade de vozes.

Online, o exército voluntário de trolls do Bharatiya Janata colocou todos na beira da violência, especialmente devido ao seu nacionalismo hindu.

 

Obter benefícios, mas evitar responsabilidade

Naturalmente, as tecnologias de mídia não fazem nada acontecer por si sós. Seus efeitos dependem de como são usadas. No contexto indiano, o governo de coalizão liderado pelo Bharatiya Janata de Modi e seus aliados digitais legitimaram um grau excepcionalmente elevado de intolerância e virulência contra minorias, em particular muçulmanos e integrantes da mais baixa casta, os chamados Dalits.

Como resultado, é fácil para os integrantes do partido e os voluntários de mídias sociais usarem plataformas digitais como WhatsApp e Facebook para inflamar sentimentos sectários. Na corrida para a eleição, eles criaram um clima de desconfiança geral, medo e paranóia no qual a desinformação não pode ser distinguida de fatos confiáveis.

Minha própria pesquisa sugere que a natureza descentralizada de redes online permitiu ao governo do Bharatiya Janata se beneficiar de mensagens de ódio e violentas enviadas por outros grupos nacionalistas hindus de linha dura, ao mesmo tempo em que era capaz de evitar a responsabilidade pelas mesmas.

Isso também permite que o partido se beneficie politicamente da violência religiosa, enquanto simultaneamente desvia a culpa para o WhatsApp ou o Facebook.

Esses desenvolvimentos na Índia levantam questões mais profundas sobre a natureza das comunicações de mídia social. Em particular, esses abusos de plataformas sociais podem levar os indivíduos a repensar a relação entre liberdade de expressão e violência.

O resultado da eleição indiana será apenas um sinal de como uma sociedade começa a lutar com a maneira como as novas tecnologias permitem que os usuários reformulem suas vidas.