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O jornal do sindicato e o trabalho de base

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Não é exagero dizer que as práticas sindicais no ambiente de trabalho funcionam como o oxigênio do sindicalismo representativo e democrático, sem elas o sindicato perde seu sentido original, é quando o prédio onde fica a direção vira sinônimo de sindicato, como único significado da palavra.

formacao 240223Porém, não basta fazer o trabalho sindical na base, é preciso que o local de trabalho tenha visibilidade, tanto aos olhos dos trabalhadores quanto da sociedade. Desse ponto de vista, os boletins, jornais e revistas sindicais tem o papel estratégico de comunicar, divulgar e dar repercussão ao que acontece nesse espaço.

É possível que uma greve ganhe espaço na mídia, que uma mobilização geral tenha repercussão regional ou nacional, mas não se ouve falar de paralisações no local de trabalho, sejam elas motivadas por reação ao autoritarismo das chefias, por injustas das empresas com seus funcionários ou por acidentes de trabalho.

Mas, e quanto a nós, dirigentes e funcionários dos sindicatos, será que estamos atribuindo às lutas que acontecem no local de trabalho a devida importância? Como as nossas publicações tratam esse local onde os trabalhadores e trabalhadoras vivem situações de trabalho, de sofrimento e resistência ao sofrimento?

Na concepção sindical da Central Única dos Trabalhadores (CUT), os nossos boletins têm uma dimensão pedagógica, pois podem cumprir um importante papel quando se trata de afirmar um contra-discurso à hierarquização ou burocratização da vida dos trabalhadores, seja nos domínios do capital, da administração pública ou na própria estrutura sindical.

Como sabemos, nenhuma publicação é neutra. Nossos boletins não podem se limitar ao tratamento de noticias, informações ou propaganda, afinal, nossa imprensa deve estar a serviço da luta dos trabalhadores. Além de fazer a disputa com as grandes agências de notícias, a imprensa sindical também cumpre um importante papel para a construção de valores e laços de pertencimento entre os iguais, fazendo da solidariedade de classe uma alternativa à ideologia do “Eu S&A”.

Nossa experiência mostra que as publicações dos nossos sindicatos são indispensáveis para a formação dos trabalhadores, para que se conheça também a dimensão social do trabalho, como atividade humana que possibilita o exercício da solidariedade, democracia, igualdade e justiça.

Portanto, os boletins sindicais são mais do que simples meio de comunicação, pois podem ser ainda um importante meio de formação, sem que deixem de ser o jornal ou boletim do sindicato, ou seja, instrumento a serviço da organização e da mobilização dos representados.

Mas não é só! Para um sindicalismo não corporativo, o jornal do sindicato não pode deixar de tratar de questões que envolvem todos os trabalhadores. A cultura da solidariedade deve se expressar tanto na ação quanto na comunicação.

Analisando os boletins de alguns sindicatos percebemos que as matérias jornalísticas podem ser divididas em dois conjuntos de notícias ou artigos: um se caracteriza pela abordagem de temas gerais da classe; o segundo conjunto pode ser caracterizado pelas questões específicas, com denúncias sobre assédio das chefias, riscos à saúde ou acidentes, eleições de CIPA, PLR.

De modo geral, pode-se dizer que as capas dos boletins tratam mais das lutas da categoria ou da classe, e as páginas internas tratam, preferencialmente, do cotidiano das relações de trabalho e das lutas específicas, compondo um projeto editorial que articula o geral e o específico, tal como o projeto da nossa central.

Mas o jornal é também um importante meio para o diálogo entre direção e os trabalhadores e trabalhadoras, portanto, um veículo aberto à crítica dos representados, que devem se reconhecer no veículo que é seu, inclusive como construtores da pauta do jornal, possibilidade que se concretiza quando se estimula a participação da base.

Portanto, não basta ter uma coluna de denúncias, mesmo que necessária, pois a simples denúncia, sem um trabalho de formação, organização e mobilização, torna-se apenas a expressão do direito de espernear diante da opressão e do sofrimento. Nossos boletins ajudam muito quando comunicam aos trabalhadores e à sociedade o que acontece no local de trabalho, do sofrimento às conquistas.

Assim colocado, tanto os jornais do sindicato servem como instrumento para o trabalho de base quanto o trabalho de base serve de instrumento para que as publicações sindicais se mantenham em sintonia com os trabalhadores e trabalhadoras. Portanto, quem atua na base deve dialogar com os responsáveis pela comunicação, apresentar a visão dos trabalhadores sobre os boletins, sobre a matéria de capa, colunas de denúncia, prestação de serviços, dentre outras.

O contato direto entre direção e base é importante, deve ser feito diretamente pelos dirigentes sindicais de base ou pelos representantes eleitos pelos trabalhadores, não por aquelas caixinhas que muitas empresas disponibilizam para que o sindicato nelas deposite os jornais e boletins, numa clara tentativa de distanciar seus “colaboradores” do sindicato.

Empresas e órgãos públicos não se limitam aos quadros de aviso e à distribuição de suas publicações. Todos sabem a importância que elas atribuem às médias chefias na sua estratégia de comunicação. O contato direto e permanente dessas chefias com os “colaboradores” raramente se limita ao trato de questões técnicas ou produtivas.

Porém, nos locais onde existe a presença de representantes sindicais, os trabalhadores tem como confrontar conceitos, valores e atitudes comunicados pela empresa com aquilo que é informado pelo sindicato, com os valores construídos pelos trabalhadores. É o que chamamos de disputa de hegemonia, condição necessária para a democratização do local de trabalho.



Fonte: CUT