É tarefa urgente do Congresso limitar os supersalários

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A parcela de juízes e procuradores que receberam vencimentos superiores ao teto constitucional em pelo menos um mês do ano aumentou de 83% em 2018 para 92% neste ano, de acordo com o Anuário de Gestão de Pessoas no Serviço Público 2024. Os dados do levantamento mostram que o avanço da elite do funcionalismo sobre o dinheiro público, em vez de diminuir, tem crescido. Por isso exige resposta imediata do Congresso. É preciso fazer valer o limite constitucional de R$ 44.008,52, salário dos ministros do Supremo. Supersalários já seriam injustos se sobrasse dinheiro no Orçamento. Com o Brasil enfrentando grave crise fiscal, são um disparate.

Os beneficiados por regalias que inflam sua remuneração são uma minoria: 0,06% do funcionalismo, em especial juízes, procuradores e militares. Mas custam caro. Magistrados da ativa e aposentados receberam R$ 32,8 bilhões de reais acima do teto de 2019 a 2023, entre indenizações e direitos eventuais. Olhar para fora do país dá a dimensão da incongruência. Os gastos anuais com tribunais de Justiça representam 1,6% do PIB brasileiro, ante média de 0,5% para os países emergentes e de 0,3% para as economias avançadas. Como o custo principal da atividade jurídica está no pessoal, não é difícil descobrir a causa do desperdício.

A Constituição prevê que fiquem fora do teto os gastos classificados como “verbas indenizatórias”. Mas não define nem delimita essa categoria. É algo que já deveria ter sido feito por lei, mas até hoje não foi. Com o vácuo, abriu-se a brecha para todo tipo de decisão com o intuito implícito de burlar o espírito da Carta. Proliferam auxílios variados: paletó, moradia, alimentação, até pré-escola. Quando contestados, costumam ser chancelados pela própria Justiça, em claro exemplo de corporativismo da magistratura interessada em manter as próprias benesses.

Em 2016, foi criada no Senado a Comissão Especial do Extrateto, com o objetivo de trazer contribuições para resolver o problema. Apresentado em 2021, o Projeto de Lei 2.721, o PL dos Supersalários, se tornou uma resposta insatisfatória. Foi desidratado na Câmara a ponto de incluir 32 exceções que permitiriam a manutenção da maioria dos absurdos usados para inflar a remuneração: conversão em dinheiro de férias não gozadas de juízes e procuradores, adicionais noturnos de funcionários do Congresso, verbas de representação de diplomatas, isenções e compensações de militares.

O texto permanece à deriva no Congresso. Os parlamentares deveriam dar a devida atenção ao tema. O ideal seria uma Proposta de Emenda à Constituição que colocasse tanto verbas indenizatórias como remuneratórias sob o teto. Se não houver consenso, o texto do PL deveria ser modificado para acabar com as exceções, limitar drasticamente o total das verbas indenizatórias e instaurar controles que evitem burla.

A remuneração do funcionalismo brasileiro é repleta de distorções: salários distintos para atividades similares, falta de conexão entre o salário e a função, descolamento do desempenho e uma barafunda de carreiras que ninguém é capaz de entender. Tudo isso colabora para tornar a gestão de recursos humanos confusa e a produtividade baixa. De todas as distorções, a mais imoral são os supersalários. Em tempos de debate sobre medidas contra o desperdício nos gastos, é urgente impor o teto aos salários do setor público. O Congresso não pode se esquivar.


Fonte: O Globo

 

 

 

 

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