Prefeitura de Aracaju é apenas a 18ª em transparência pública no Brasil

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Ontem foi publicada pela Organização Não Governamental (ONG) Transparência Internacional/Brasil a mais nova pesquisa sobre o Índice de Transparência e Governança Pública (ITGP). O estudo está focado nas prefeituras de capitais brasileiras e o resultado sobre Aracaju é considerado “regular”, porém em condição muito desfavorável.

Das 25 capitais pesquisadas, a Prefeitura de Aracaju ficou apenas no 18º lugar, com 46,3 pontos, abaixo da média nacional (54,8). Cada administração de capital recebeu uma nota de zero a 100, no qual zero indica o pior resultado e 100 o melhor em matéria de transparência e governança pública. Distrito Federal e de Porto Alegre (em razão das enchentes) não entraram na pesquisa.

A Prefeitura de Vitória/ES foi apontada como a de maior transparência com pontuação de 98,6 (ou seja, bem mais que o dobro de pontos de Aracaju) e classificada como “ótima”. Na outra ponta está a Prefeitura de Macapá, sendo a última colocada, com 31 pontos.

No Nordeste, a prefeitura de capital que lidera a transparência e a governança pública é a de Recife com pontuação de 79,6, isto é, 33,3 pontos a mais que Aracaju.

Importante destacar que o ITGP é uma avaliação regular que mede indicadores importantes para a transparência de entes públicos. A edição de 2024 da pesquisa avalia dimensões como governança, legislação, participação social, engajamento e comunicação, plataformas, transparência administrativa e orçamentária e obras públicas nas prefeituras. Confira aqui a pesquisa na íntegra.

Falta transparência de emendas parlamentares

Utilizando-se como parâmetro somente o Nordeste, a situação da Prefeitura de Aracaju no quesito de transparência envolvendo o quesito “administração e governança” das verbas públicas ainda é ruim. Aracaju chegou aos 41,2 pontos (dos 100), os mesmos da Prefeitura de Natal. A maior pontuação do Nordeste foi do Recife com 88,2 e a menor de Teresina com 23,5. A média nacional nesse caso foi de 58,5 pontos.

Importante esclarecer que esse índice de “administração e governança” avalia a transparência no uso de emendas parlamentares, que desempenham papel significativo nos municípios, especialmente em anos eleitorais.

Grande parte dessas emendas chega nas prefeituras por meio das emendas individuais de transferência especial, popularmente conhecida como emenda Pix, que a Mangue Jornalismo também já revelou em reportagem no ano passado: Municípios de Sergipe receberam mais de R$ 133 milhões via Emenda Pix de deputados federais e senadores. A falta de transparência é regra nos repasses. Leia essa reportagem aqui.

Para a ONG Transparência Internacional/Brasil, esse tipo de emenda ocupa uma parcela cada vez mais significativa no orçamento da União repassado aos municípios e isso preocupa.

“A falta de transparência em obras públicas e na execução de emendas parlamentares é uma das principais preocupações levantadas pela avaliação. Essas áreas são particularmente vulneráveis à corrupção, pois envolvem grandes volumes de recursos financeiros, e, devido seu impacto na percepção pública sobre a gestão municipal, ganham ainda mais relevância em ano de eleições”, analisa o relatório.

Próximo ao pleito municipal, a ONG alerta para “a falta de transparência nesses setores pode permitir a manipulação de informações, desvio de verbas e favorecimento de projetos que beneficiam candidatos específicos, distorcendo a resposta da população nas urnas e podendo comprometer a integridade do processo eleitoral”.

“Em ano eleitoral, essas transferências aumentaram e são investidas em obras e projetos de infraestrutura de grande visibilidade para maximizar o retorno eleitoral de candidatos”, afirma Maria Dominguez, coordenadora do Programa de Integridade e Governança Pública da Transparência Internacional – Brasil.

Falta clareza e acessibilidade das informações financeiras e orçamentárias

Um outro item do ITGP em que a Prefeitura de Aracaju também não vai bem é “transparência financeira e orçamentária”. Aqui, a organização “avalia a clareza e a acessibilidade das informações financeiras e orçamentárias” da prefeitura. Nesse índice, Aracaju só chegou a 34,7 pontos dos 100 possíveis.

No Nordeste ficou à frente apenas das prefeituras de Teresina (32,7) e de Natal (30,6). Na ponta de cima estão Recife (80,6) e João Pessoa (79,1). A média nacional foi de 48,9 pontos.

Alinhado a esse índice existe um outro chamado de “participação, engajamento e comunicação” e que mede o envolvimento da população e a comunicação das administrações com o público. Também aqui a Prefeitura de Aracaju não tem bom desempenho, apenas atingindo 38,5 pontos e ficando acima da Administração de São Luís (30,8). No quesito “participação e comunicação”, por exemplo, a Prefeitura de João Pessoa chegou aos 92,3 pontos. A média nacional foi 52,5 pontos.

Para Fábio Prado, mestre em Economia e professor do Departamento de Ciências Contábeis da Universidade Federal de Sergipe (UFS), a transparência é essencial para qualquer democracia. Segundo ele, os portais de transparência são instrumentos importantes e devem trazer o máximo de informações e seguir as instruções normativas do Governo Federal para que funcionem com clareza e objetividade.

Segundo ele, o portal, que é um dever do município, deve seguir as diretrizes da Lei da Transparência e da Lei de Acesso à Informação (LAI), que prevê a obrigatoriedade de divulgação dos dados na internet e exige nos sites uma ferramenta de pesquisa de conteúdo que permita o acesso à informação de forma objetiva, transparente, clara e em linguagem de fácil compreensão.

Sobre Aracaju, a Transparência Internacional/Brasil, entende que a “capital do Sergipe regulamentou a Lei Anticorrupção, possui canal para denúncias de corrupção, relatórios estatísticos de ouvidoria e publica dados, ainda que nem sempre nos formatos adequados, sobre salários dos servidores, receitas, despesas e licitações. A capital pode aprimorar seus níveis de transparência ao investir na abertura de dados de áreas com altos riscos de corrupção, como obras públicas e emendas parlamentares. Outro ponto de atenção é o baixo investimento em iniciativas de participação e engajamento dos cidadãos”.

Na “dimensão legal” da pesquisa se avalia a regulamentação de leis essenciais, como a Lei Anticorrupção e a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). Quanto às “plataformas”, verifica-se a existência e a qualidade de plataformas digitais para a divulgação de informações públicas.

Quanto à “administração e governança” se analisa a estrutura e os mecanismos de governança utilizados pelas capitais, principalmente a transparência no uso de emendas parlamentares. Sobre “obras públicas”, examina-se a transparência na execução das obras públicas.

Já sobre “transparência financeira e orçamentária”, avalia-se a clareza e a acessibilidade das informações financeiras e orçamentárias. No quesito “participação, engajamento e comunicação”, mede-se o engajamento da população e a comunicação das administrações com o público.

Baixa transparência na Prefeitura de Aracaju não é novidade

No ano passado, a Mangue Jornalismo publicou o relatório “Ranking da Transparência na União, Estados e Capitais do Brasil”, produzido por um grupo de pesquisa da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), e lá a Prefeitura de Aracaju já aparecia como a última capital no ranking de transparência pública. Leia a reportagem aqui.

A pesquisa da USP analisou os portais eletrônicos de transparência dos estados e suas respectivas capitais entre 2021 e 2022, levando em consideração a acessibilidade e praticidade no acesso à informação. No caso de Aracaju, foi destacada a falta de efetividade na ferramenta de busca do Portal de Transparência e problemas com a acessibilidade.

O professor Obanshe Severo, presidente do Sindicato dos Profissionais do Ensino do Município de Aracaju (Sindipema), disse que é muito complicado encontrar as informações no site da prefeitura. “Quando encontramos as informações e fazemos as denúncias têm alguma alteração no site ou no próprio documento. Já até aconteceu de mudarem a rubrica para não identificarmos a movimentação financeira”, lembrou Obanshe.

O professor descreve uma longa disputa no Conselho de Acompanhamento e Controle Social das verbas da Educação por haver uma negativa permanente de disponibilizar as informações necessárias para a correta análise da prestação de contas da prefeitura. “Foi necessário fazermos denúncia tanto no Ministério Público quanto no Tribunal de Contas do Estado. Até informações corriqueiras são negadas e precisamos acionar o Judiciário”, informa o presidente do Sindipema.

Por nota, na época, a Controladoria-Geral do Município de Aracaju afirmou que implementaria as novas regras estabelecidas pela Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon) para todos os Portais da Transparência do país. Também alegou que o ranking do Núcleo de Estudos da Transparência da USP era produzido por estudantes, sem caráter oficial e que lá são utilizados critérios diversos dos adotados pelo Tribunal de Contas do Estado de Sergipe.

Recomendações de melhorias para aumentar a transparência

Para a ONG Transparência Internacional/Brasil, a avaliação das capitais brasileiras mostra que ainda há muito a ser feito para garantir a transparência nesses municípios. Em um ano eleitoral, é essencial que as prefeituras aprimorem suas práticas de transparência.

A ONG também relacionou seis ações que são cruciais para se aumentar a transparência das cidades brasileiras:

1 – Regulamentar a Lei Anticorrupção em nível local;
2 – Criar normas e mecanismos de proteção a denunciantes de corrupção;
3 – Aprimorar a transparência de contratos, licitações e incentivos fiscais;
4 – Disponibilizar informações sobre emendas parlamentares recebidas pelo município;
5 – Criar portais de dados abertos e específicos para obras públicas e licenças ambientais;
6 – Fortalecer mecanismos de controle social, como audiências e consultas públicas.

Resposta

 

Na tarde da quarta-feira, 17, a Prefeitura de Aracaju enviou a seguinte nota sobre a reportagem acima: O Município de Aracaju segue empenhado em alcançar as melhores notas no Ranking da Transparência, instituído no PNPT – Plano Nacional de Transparência Pública, adotado pelo TCE/SE, seguindo as exigências dos requisitos apresentados na Cartilha Nacional criada pela ATRICON – Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil, cuja edição de avaliação para o exercício de 2024 está em fase de conclusão.

O PNTP consiste em uma iniciativa da Atricon, do TCE-MT e do TCU, com o objetivo de padronizar, orientar, estimular, induzir e fiscalizar a transparência das informações produzidas e/ou custeadas pelo Poder Público em todo o país. Sua implementação decorre do Acordo Plurilateral de Cooperação Técnica nº 03/2022, que prevê a realização de ações nacionais coordenadas envolvendo os Tribunais de Contas, o IRB, a Abracom, o CNPTC, o Conaci, além da Atricon.

A pesquisa da Transparência Internacional Brasil, apesar da relevância do trabalho realizado, utiliza uma métrica com requisitos diferentes da Cartilha do PNTP, consequentemente apresentam resultados que certamente serão divergentes.

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